O Otimismo de Obama

A Primeira Morte de Obama

Correio Braziliense e Estado de Minas – domingo, 10 de fevereiro de 2012.

Pensar, representar e estar presente é a rotina da vida pública e das pretensões que a acompanham. Para quem ganhou o Premio Nobel da Paz, no início do seu primeiro mandato, somente pela força do símbolo de mudança contido no fato de ser o primeiro negro a chegar à presidência dos Estados Unidos, Barack Obama frustrou muita gente. Por isso mesmo, ele certamente não se surpreendeu com o fato de atrair para sua posse metade da multidão que quatro anos antes inundou a esplanada do Capitólio em Washington. A esperança, em política, vem sempre acompanhada de um pouco de interesse e cobiça, que provocam desapontamento quando não atendidos.

Mas Obama surpreendeu ao falar do que sentia na cerimônia que coroa o juramento presidencial. Colocando explosão nas palavras e atento à forte noção da pátria que dirige, comparou sua sensação naquele instante ao juramento do soldado ao se alistar e ao do imigrante, que ainda vê a América como uma terra para realizar seus sonhos.

Um segundo mandato para os democratas parece ter despertado o presidente – que nunca mais terá que enfrentar as urnas – para a realidade das coisas e a força do discurso da esperança. Pareceu mais seguro sobre as vantagens do diálogo internacional para a solução de controvérsias. Ofereceu novos caminhos à iniciativa privada para o enfrentamento das mudanças tecnológicas que o país necessita na área de energia e inovação. Sinalizou uma mudança de rumo na agenda militar sem temer as cobranças por protagonismo mundial, embora tenha dito claramente que pela força das armas defenderá os valores da nação. Mostrou responsabilidade com o planeta prometendo agir para enfrentar o curso ameaçador da mudança climática que todos vemos diariamente.

Abriu o coração para a defesa da igualdade de todos perante a lei, dando novo alento à luta contra o preconceito de natureza sexual, racial e social. Ofereceu a voz aos imigrantes na sua busca por oportunidades de trabalho e no seu direito de não serem expulsos do país. Afinal, são 11 milhões de ilegais, a maioria latinos, e dentre eles milhares que entraram clandestinos quando eram crianças e só entendem os EUA como sua pátria.

Criticou o espetáculo da polarização política, a política dos políticos, que paralisa os esforços rumo à superação das dificuldades econômicas. Deixou claro sua disposição de buscar garantir a Seguridade Social e a proteção à saúde para todos. Mandou um recado aos diplomatas pedindo deles coragem para resolverem pacificamente as diferenças com outras nações, “não porque somos ingênuos diante das ameaças que encaramos, mas porque o diálogo pode eliminar de modo mais durável a desconfiança e o medo”.

Ao sinalizar pela ampliação do foco da politica externa para além das intervenções militares, Obama quer retornar triunfante ao conceito mais amplo de “liderança global dos EUA”. Assim, interesses norte-americanos no exterior serão mais do que mero deslocamento de tropas, vigilância e ataque com aviões não tripulados (Drones) e o desfilar de armas modernas em feiras e exposições.

Mas o ambiente político em um país cercado de armas é raramente “antiguerra” e dois casos polêmicos continuam na mira. A impaciência com a Síria – que vê o êxodo de refugiados aumentar a cada dia na fuga da guerra civil – não vai diminuir, mas também não haverá postura afoita para resolver a situação de qualquer maneira. A política de contenção passiva daquela ditadura buscará, principalmente, não perder o controle sobre o uso de armas químicas numa região sempre tensa. O Departamento de Estado está instruído a enrolar, até surgir no horizonte uma possiblidade de transição que evite o colapso do Estado sírio e atritos com chineses e russos, protetores do atual regime. Já com o Irã, caso diminuam muito as esperanças de ver o país mudar seu cálculo político, a política de prevenção ativa pode se desdobrar rapidamente em confronto armado, com um ataque às instalações nucleares a fim de impedi-lo de obter uma arma atômica. Mas isso só depois que todas as investidas diplomáticas falhassem de maneira patente. Os EUA não querem se envolver em mais confusão no exterior. Os desafios domésticos e não militares andam mais extenuantes.

Agora, mais fundamentalmente, é preciso perseguir a liderança econômica através do comércio; ter voz ativa no debate tecnológico sobre questões climáticas e energéticas; ser inovador nos desafios da segurança alimentar. E para isso, Obama reafirmou sua crença na importância do governo e da “ação coletiva” especialmente em tempos de crise.

O vigor e a substância das palavras de Obama serão postos à prova quando as prioridades e estratégias forem apresentadas no seu discurso ao Congresso, normalmente áspero com o presidente, dia 12, véspera da quarta feira de cinzas.

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PAULO DELGADO é sociólogo.

 

 

Paulo Delgado
Paulo Delgado
Sociólogo, Pós-Graduado em Ciência Política, Professor Universitário, Deputado Constituinte em 1988, exerceu mandatos federais até 2011. Consultor de Empresas e Instituições, escreve para os jornais O Estado de S. Paulo, Estado de Minas e Correio Braziliense.

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