Eleições pelo mundo
Estado de Minas e Correio Braziliense, domingo, 6 de março de 2016.
Primeiro foi Taiwan, a ilha formosa que vive difícil novela com sua mãe China. Depois Vanuatu, o arquipélago de mais de 80 ilhas no Pacífico, quase desabitado. Um paraíso açoitado por ciclones. E também Portugal, a terrinha que transmitiu o cerne de nossas principais instituições. Três países que iniciaram o ano com eleições nacionais.
Depois veio fevereiro, mês da purificação desde a Roma antiga, e a onda se alastrou pelo mundo. A começar pela República Centro-Africana, país sem mar algum. Condição que não determina o subdesenvolvimento, afinal a Suíça também é do interior, mas que atrapalha bem. Não é mera coincidência que, no grupo dos países mais pobres, a maioria é do interior dos continentes, sem acesso soberano a praia alguma. Faustin-Archange Touadera foi eleito presidente. Matemático de formação, espera-se que Touadera consiga fazer mais do que contar os mortos e os desalojados que a sangrenta disputa entre comunidades que teimam em não se reconciliar.
Continuando o mês, Uganda, Níger, Comores, Jamaica, Irlanda e Irã, cada um a seu modo teve seu escrutínio. Isso para não falar de Bolívia e Suíça que fizeram importantes referendos nacionais. A Suíça, como é de praxe, campeã internacional desse modo de governar através de referendos, botou uma lista de iniciativas populares para serem aprovadas ou não pelo povo em geral. Apenas uma o foi. Tratava do tráfego através dos Alpes com obras em um importante túnel. No altiplano boliviano discutiu-se, por outro lado, não prosaicas melhorias no dia-a-dia da população, mas sim o elevado senso de insubstitutibilidade de seu atual presidente. Evo queria ser eterno como neve nos Andes. Para o bem da família dele, e do país, foi derrotado.
Março começou com outro referendo, dessa vez na Nova Zelândia. A convocação às urnas é para definir como deve ser a bandeira do país. Se for preservada na flâmula a soberana inglesa como chefe de Estado, nada muda. Também já tivemos Samoa e Eslováquia, anteontem e ontem, decidindo a composição de seus respectivos parlamentos.
Hoje, domingo, é o Benin que decide através de seus 4,5 milhões de eleitores o substituto de Thomas Boni Yayi, atual presidente do país. Oficialmente a campanha para o cargo só dura quinze dias. Trinta e três candidatos estão concorrendo. Outrora sítio do Reino Daomé, que enriqueceu exportando escravos para o Brasil, o Benin foi o primeiro país africano a fazer uma transição de ditadura para democracia. Boni Yayi doutorou-se em economia na Universidade Paris Dauphine, a instituição francesa mais próxima do estudo da importância das instituições, com suas leis escritas e seus códigos tácitos, para o desenvolvimento dos países. Dentro dessa ótica, o conceito de “dependência do caminho” é valorizado para entender o porquê e o como do mapa das possibilidades e das junções críticas que possibilitam rumar para o futuro. Uma curiosidade sobre o Benin: Boni Yayi casou-se com uma descendente direta do maior mercador de escravos que atuou em sua terra dois séculos atrás. O brasileiro Francisco Félix de Sousa. Por conta das confusões gerais, num país bem avaliado entre seus pares africanos, pelas entidades de Bretton Woods, Yayi joga pesado nas atuais eleições para eleger seu sucessor, inclusive para não ser perseguido judicialmente depois como registrou Le Monde recentemente.
São ainda outras várias as votações nacionais previstas para 2016. Os britânicos, por exemplo, estão em peculiar campanha antecedendo a decisão de continuarem ou não na União Europeia, que será submetida a referendo em junho. Nenhuma, todavia, é tão aguardada e escrutinada como a que ocorre em 8 de novembro. Será a vez dos EUA elegerem seu quadragésimo quinto presidente. O sistema de primárias alonga o processo eleitoral e põe os candidatos à prova em fogo alto. Com as novidades tecnológicas de informação, a busca de votos é high tech, mas acaba suscetível a populismos e manipulações.
Com Hillary Clinton e Donald Trump conquistando a maioria das nomeações de delegados até o momento, as eleições americanas vão ganhando contorno favorável aos democratas. Mesmo que Rubio e Cruz se unam para desalojar Trump do posto de candidato, o preparo de Hillary e sua maior capacidade de aglutinar forças centristas será um trunfo e tanto. Mas o eleitor é livre, essa é a aparente mágica da democracia no dia da eleição.
Mesmo que democráticas, não há eleição que não seja feita com mágica. E o convencimento de que mágica eleitoral é muitas vezes puro e danoso engodo político é trabalho educacional difícil, de Porto Novo, capital do Benin, a Taipé, capital de Taiwan. Washington, que inventou essa moda, que o diga.
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PAULO DELGADO é sociólogo e Coordenador do CIEE Nacional.