Correio Braziliense e Estado de Minas – domingo, 8 de Março de 2015.
Na América do Sul política é solavanco e a economia a sua marionete. Região peculiar povoada de líderes indiferentes a crítica, que de forma pessoal e apaixonada, experimentam variadas catástrofes desnecessárias. Continuam em vigor as influências sombrias do passado próprio de povos coletores e do poder oligárquico comprometido com uma caótica fixação rebelde no atraso. É o lugar preferido da enxurrada ideológica e o ar superior do governante que parece estar pegando fogo.
Os erros e acertos se anulam no final, indo de uma experimentação para outra, nos ombros do fanatismo e do consumismo sem sentido. Argentina e Venezuela são expoentes recentes dos exageros que se esgotam. Os dois principais países do Mercosul, depois do Brasil, estão em grave desacerto econômico há tempos. A instabilidade política reina nessas duas repúblicas tomadas por um esquerdismo retórico que perdeu o orgulho pela razão. Seus respectivos governos começam 2015 na posição de maior fragilidade e antipatia popular que já experimentaram. Se forem razoáveis deveriam trabalhar por sua transição democrática.
A confusão econômica argentina, intermitente há 30 anos, é outra vez um céu assombrado que contamina a sempre adiada alvorada brasileira e corrói os ganhos potenciais da parceria natural que mantemos com eles. Uma Argentina pujante e confiável proporcionaria um dos melhores cenários externos para o equilíbrio e desenvolvimento da economia brasileira. Entretanto, pujança e estabilidade são justamente dois predicados ausentes da realidade do vizinho que se vale da amizade autocomplacente que o Brasil lhe dedica para nos trair.
O Brasil, por sua vez, segue a trajetória histórica de frustrar quem o admira e continua sua vocação de amador entre as nações. Basta observar o sofrimento das cédulas do nosso dinheiro diante da instabilidade econômica e da mania do governo se meter em tudo. Nem seu tamanho geométrico permanece inalterado. Um mesmo valor, diferentes formas, de um dia para o outro, tornam impossível ao filho usar a carteira que recebeu de presente do pai. Mas a Argentina sempre vai além. Esse mês as notas de 50 pesos ressuscitaram em sua estampa a controvérsia das Malvinas. Foi com uma piada provocativa que o ministro britânico respondeu sobre o que vale a realidade da questão para eles. Menos de quatro libras, insinuou ser o equivalente ao valor político da medida que só interessa à numismática.
Sem consideração pelos vizinhos a Argentina vai tentando mudar o balanço regional se oferecendo aos interesses geopolíticos da China no cone sul. O Brasil, que não vê as enrascadas econômicas do vizinho fragilizando nossa economia parece enfiar a cabeça na areia para não tomar conhecimento das diretrizes de política internacional que alinham Buenos Aires com Pequim. Em 10 anos o Brasil perdeu no mercado argentino o que a China ganhou no mesmo período. Com a entrada da Venezuela no Mercosul já havia ficado claro que o arranjo econômico regional é secundário para Brasília. Quem sabe agora, com a invasão da China, possamos pensar em como é anti-progressista governar sem desejos do futuro.
A elite histórica venezuelana é das piores que já desfilaram pelos palácios latino-americanos. As distorções causadas pela super dependência que o país tem das suas exportações de petróleo sempre foram o gatilho para revoltas populares e maquinações golpistas. As formas institucionalizadas de se ganhar dinheiro no país seguem o modelo africano das oligarquias podres. E elite por elite, o que se viu é que a revolução chavista nunca deixou de ser uma paródia da original.
O governo de Nicolás Maduro é um desastre completo. Não há possibilidade de continuação de Hugo Chaves na pele de outro. Governos personalistas só alcançam legitimidade popular com o magnetismo, carisma e contexto que cria seu próprio sol, mas não ilumina seus satélites. A aventura de Maduro à frente da Venezuela, em um momento em que os lucros advindos do petróleo mínguam, é tragédia na certa. O complô americano que ele diz enxergar não é nada mais do que a circunstância histórica em que se exauriu a possibilidade do modelo populista ser mantido democraticamente.
Um relativo oásis de serenidade e boa política tem sido o Uruguai desde o primeiro governo de Tabaré Vasquez. A especial passagem de José Mujica pelo cargo dotou a região de uma figura exemplar de chefe de estado. A autenticidade de Mujica é um alento e um alerta. Alerta para os deslumbrados com os anjos estranhos que infiltram no sangue do poder. E alento para os coerentes que sempre souberam ser possível avançar agendas reprimidas sem lançar o nome na lama nem o país no caos.
******
Necessary cookies are absolutely essential for the website to function properly. This category only includes cookies that ensures basic functionalities and security features of the website. These cookies do not store any personal information.
Any cookies that may not be particularly necessary for the website to function and is used specifically to collect user personal data via analytics, ads, other embedded contents are termed as non-necessary cookies. It is mandatory to procure user consent prior to running these cookies on your website.