PROJETO DE LEI Nº. 5580, DE 2005

Dispõe sobre a criação da lei de responsabilidade educacional, alterando a Lei nº 8069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente; a Lei nº 8429, de 2 de junho de 1992, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional; a Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996, que dispõe sobre as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, e a Lei nº 9424, de 24 de dezembro de 1996, que dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, na forma prevista no art. 60, § 7º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

O CONGRESSO NACIONAL DECRETA

Art. 1º Os artigos 101, 245 e 249 da Lei nº 8069, de 13 de julho de 1990, passam a ter a seguintes redações:

“Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
I ………………………
II………………………
III – matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental ou médio.

Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à entidade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente;
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.
Parágrafo único – Na mesma pena incorre o professor ou o responsável por estabelecimento de ensino fundamental, de pré-escola e de creche que descumpre a obrigação de notificar ao Conselho Tutelar do Município a relação dos alunos com reiteradas faltas injustificadas, esgotados os recursos escolares, e aqueles em situação de evasão escolar, bem como os casos de maus-tratos envolvendo seus alunos.

Art. 249. Descumprir dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação de autoridades judiciárias ou Conselho Tutelar.
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.
Parágrafo único – Na mesma pena incorrem os pais ou responsáveis que deixarem de efetuar a matrícula de seu filho ou de criança que têm sob sua guarda ou tutela, a partir da idade e nas séries obrigatórias.”

Art. 2º O artigo 11 da Lei nº 8429, de 2 de junho de 1992, passa a ter a seguinte redação:

“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa, que atenta contra os princípios da administração pública, qualquer ação ou omissão que viole os deveres de cumprimento da lei, honestidade, imparcialidade, lealdade às instituições e notadamente:
I …………………..
II…………………..
III………………….
IV………………….
VI………………….
VII…………………
VIII – deixar de aplicar, a autoridade e o agente público, direta ou indiretamente responsável, o percentual constitucional mínimo da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino;
IX – ordenar ou autorizar, a autoridade e o agente público, direta ou indiretamente responsável, a aplicação de recursos provenientes de transferências, entre os entes federados, fundos ou outras fontes de receitas, no pagamento de despesas em desacordo com a legislação vigente.
Parágrafo único. A reincidência dos atos relativos aos incisos VIII ou IX deste artigo implicará na aplicação da penalidade a que se refere o inciso I, alínea g, artigo 1°, da Lei Complementar n° 64, de 18 de maio de 1990.”

Art. 3º Os artigos 4º, 5º, 6º e 24 da Lei 9394, de 20 de dezembro de 1996, passam a vigorar com as seguintes redações:

“Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:
I………………………
II……………………..
III…………………….
IV…………………….
V……………………..
VI…………………….
VII……………………
VIII – atendimento ao educando, nas instituições públicas de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

Art. 5º O acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical e entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o poder público para exigi-lo.

§ 1º Compete aos estados e aos municípios, em regime de colaboração, e com a assistência da União:

I – recensear a população em idade escolar para o ensino fundamental e médio, com especial atenção para os grupos de seis a quatorze anos e de quinze a dezoito anos de idade;
II………………………
III……………………..

§ 2º…………………..

§ 3º…………………..

§ 4º…………………..

Art. 6º É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças, e adolescentes e jovens dos seis e os dezoito anos de idade, no ensino fundamental e no ensino médio, conforme a lei em vigor.

Art. 7º………………….

Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.

§ 1º……………………..

§ 2º. Os sistemas de ensino terão liberdade de organização nos termos desta Lei e contarão, em cada esfera de governo, com Conselhos de Educação, em caráter permanente e deliberativo, composto por representantes do governo, prestadores de serviço educacional, profissionais de educação e usuários do sistema de ensino, com atuação na formulação de estratégias e no controle da execução da política de educação na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera de governo.”

Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns:

I ……………………..
II……………………..
III…………………….
IV …………………..
V…………………….
VI – o controle de freqüência fica a cargo da escola, conforme o disposto no seu regimento e nas normas do respectivo sistema de ensino, observada, quando obrigatória, a comunicação da reiteração de faltas injustificadas, da evasão escolar e dos casos de repetência à família e ao Conselho de Educação competente, exigida a freqüência mínima de setenta e cinco por cento do total de horas letivas para aprovação.

Art. 4º Os artigos 3º, 4º e 5º da Lei nº 9424, de 24 de dezembro de 1996, passarão a ter as seguintes redações:

“Art. 3º Os recursos do Fundo, previstos no art. 1º, serão repassados automaticamente para contas únicas e específicas dos governos estaduais, do Distrito Federal e dos Municípios, vinculadas ao Fundo, instituídas para esse fim e mantidas na instituição financeira de que trata o art. 93 da Lei nº 5172, de 25 de outubro de 1966, nas quais serão creditados e obrigatoriamente movimentados na sua destinação principal.

§1º…………………….

§2º…………………….

§3º…………………….

§4º…………………….

§5º…………………….

§6º…………………….

§7º…………………….

§8º…………………….

§9º…………………….

§10. Estados, Distrito Federal e Municípios darão, mensalmente, publicidade do total dos recursos financeiros recebidos à conta do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino e, a cada mês, mediante publicação no Diário Oficial ou, na inexistência deste, em jornal de grande circulação local, discriminando-se os valores por origem dos recursos, bem como as ações e atividades a que se destinam.

Art. 4º O acompanhamento e o controle social sobre a repartição, a transferência e a aplicação dos recursos do Fundo serão exercidos, junto aos respectivos governos, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por Conselhos de Educação, obrigatoriamente compostos com a participação efetiva de membros da sociedade civil por ela indicados, além da representação institucional, a serem instituídos em cada esfera no prazo de cento e oitenta dias, a contar da vigência desta Lei.

§1º…………………….

§2º……………………..

§3º……………………..

§4º Os Conselhos instituídos, que exercerão a função de controle social, seja no âmbito federal, estadual, do Distrito Federal ou municipal, terão apoio físico e administrativo garantido pelo poder da instância correspondente, e seus membros não perceberão qualquer espécie de remuneração pela participação no colegiado, seja em reunião ordinária ou extraordinária.

§ 5º No exercício de sua função de controle social poderá o Conselho:
I – requisitar ao Poder Executivo, responsabilizando-se, na forma da lei, pelo sigilo das informações e documentos confidenciais, documentos referentes a:

a) licitação, empenho, liquidação e pagamento de obras e serviços com recursos do Fundo;
b) folhas de pagamento dos profissionais da educação beneficiados, as quais deverão discriminar aqueles em efetivo exercício no ensino público pertinente;
c) outros documentos necessários ao desempenho de suas funções.

II – realizar visitas in loco para verificar:

a) o desenvolvimento regular de obras e serviços efetuados nas instituições escolares com recursos do Fundo;
b) a adequação do serviço de transporte escolar;
c) a utilização em benefício do sistema de ensino, de bens adquiridos com recursos do Fundo;

Art. 5º Os registros contábeis e os demonstrativos gerenciais, mensais e atualizados, relativos aos recursos repassados ou recebidos à conta do Fundo a que se refere o art. 1º, ficarão permanentemente à disposição dos conselhos responsáveis pelo acompanhamento e controle social no âmbito da União, do Estado, do Distrito Federal e dos Municípios, e dos órgãos federais, estaduais e municipais de controle interno e externo.

§ 1º A instituição financeira, a que se refere o art. 3º, colocará permanentemente à disposição dos Conselhos de Acompanhamento e Controle Social os extratos bancários referentes à conta do Fundo.

§ 2º Os dados referentes ao Fundo constarão, de forma discriminada, das prestações de contas a que se refere o art. 72 da Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1998.

Art. 6° A inobservância do disposto na alínea b, art. 25, da Lei Complementar n° 101, de 4 de maio de 2000, implicará na redução das transferências voluntárias no período subseqüente em valor semelhante ao não cumprimento, no período corrente, das despesas com educação nos limites constitucionais estabelecidos.

Parágrafo único. O agente público responsável pela gestão dos recursos na área de educação incorre em ato de improbidade administrativa, nos termos do art. 37 da Constituição Federal e dos incisos II e IV da Lei nº 8429, de 2 de junho de 1992, podendo resultar na perda do cargo ou da função que ocupa, caso a prestação de contas e o cumprimento de demais disposições normativas se enquadrem no que dispõe o caput deste artigo.

Art. 7º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Justificativa

União, Estados, Distrito Federal e Municípios têm realizado esforços progressivos no sentido de darem preferência aos gastos na área da educação, seja em custeio ou investimento, a fim de garantir o acesso e permanência da população escolar na escola, viabilizando uma educação de qualidade aos milhões de crianças, adolescentes e jovens, por todo o território nacional.
Igualmente docentes vêm recebendo atenção renovada dessas esferas institucionais e administrativas para que desempenhem com satisfação a função do magistério, em condições dignas de trabalho, e, ainda, recebam uma formação adequada e continuada. Estes esforços, no entanto, continuam aquém dos objetivos e reivindicações formuladas pelos setores da sociedade civil envolvidos na área.

Ao lado dos esforços mencionados, constata-se o descumprimento de disposições constitucionais e legais de muitas administrações públicas nos diversos níveis de gestão. Sabe-se, por exemplo, que milhões de crianças deixam de receber a merenda escolar por falta de recursos, desviados para outros projetos e atividades. Do mesmo modo, escolas deixam de ser construídas, dependências escolares se mantém sem conservação, professores(as) permanecem recebendo salários baixos e alunos(as) fora das salas de aula.

O risco da permanência dessa irresponsabilidade social pública com relação à educação brasileira é o recrudescimento do analfabetismo, da evasão escolar e do abandono da escola, entre outros sérios e irremediáveis estrangulamentos na organização e desenvolvimento da educação básica. A pátria perde conhecimento, o país fica mais pobre de idéias, as crianças e os jovens perdem a oportunidade de tornarem-se pessoas com níveis mais elevados de escolaridade e culturais, aptos a conviverem de forma contextualizada no mundo contemporâneo.

Estabelece a Constituição Federal (CF) em seus artigos 24, inciso IX e Art. 211 que a União, os Estados e o DF devem legislar de maneira concorrente sobre educação, cultura, ensino e desporto. Ao mesmo tempo todo Capítulo III, Seção I, do Art. 205 ao 214, definem princípios , meios e normas que levam a que União, Estados, Distrito Federal e Municípios colaborem sempre, e a qualquer momento, no sentido de realizarem com sucesso os programas educacionais que lhes competem e garantam a sua universalização.

Em nível infra-constitucional, a legislação específica – Lei de Diretrize se Bases e outras, procuram explicitar e regulamentar os dispositivos da CF, dando seqüência aos atos necessários à consecução eficiente e eficaz dos objetivos para a área de educação. Nesta direção destaca-se o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), a encerrar-se em setembro de 2006. Neste sentido, acaba de ser enviada ao Congresso Nacional pelo Poder Executivo uma Proposta de Emenda Constitucional, definindo a criação de um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), que amplia a ação do FUNDEF e prevê para tal a duração de quatorze anos de vigência.

Dentre os temas polêmicos da gestão educacional, destaca-se a pertinência ou não da descentralização dos programas federais entre Estados, Distrito Federal e Municípios. Inúmeras denúncias chegam ao conhecimento da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados. O Tribunal de Contas da União destacava sobre as contas do Governo Federal de 2002, por exemplo, que um entre cinco professores(as) não sabia da exigência de criação de um conselho de acompanhamento e controle social do FUNDEF, e que um em cada dois professores(as) e diretores(as) de escolas não sabiam quem era o seu representante e, pior, como fora ele escolhido. A maioria dos conselheiros(as) havia sido indicada pelos prefeitos e secretários de educação dos municípios em que foram constituídos os conselhos de educação.

A falta de responsabilidade social com a educação tem prejudicado a história, e conseqüentemente o futuro do país, atrasa os pressupostos para a edificação de uma sociedade livre, justa e fraterna, além de penalizar de maneira irremediável os conhecimentos que iriam receber milhões de crianças e jovens.
Com o objetivo de contribuir para encerrar mais esta página infeliz de falta de cuidado com a construção do exercício pleno da cidadania, os direitos humanos e o espírito público que encaminho a esta Casa o presente projeto de lei dispondo sobre a responsabilidade social na gestão da educação.

Em síntese, a presente propositura encaminha uma adequação da legislação vigente visando a cobertura de toda demanda da educação básica, além de alguns dispositivos direcionados para coibir a prática de desmando público com relação a aplicação das verbas destinadas à área da educação, estabelecendo as circunstâncias e condições pelas quais a autoridade pública poderá vir a ser punida, bem como o gestor direta ou indiretamente responsável. Aguardo a compreensão e o apoio dos ilustres pares para mais esta iniciativa de melhoria da educação e ensino em particular, e da responsabilidade social em geral no nosso país.

Em tempo, agradeço a colaboração da UNESCO, organização internacional sempre atenta e preocupada com a educação no mundo; à Associação Brasileira dos Magistrados e Promotores da Infância e da Juventude (ABMP), que contribuiu com sugestões enviadas à UNESCO na discussão de temas relacionados; e aos nobres Deputados Professor Luizinho e Fátima Bezerra, o primeiro autor do PL n° 241, 1999, e a segunda, sua relatora na Comissão de Constituição e Justiça e de Redação, os quais forneceram elementos úteis aproveitados na elaboração deste projeto de lei.

Sala das Sessões, 30 de junho de 2005.
Paulo Delgado
Deputado

Paulo Delgado
Paulo Delgado
Sociólogo, Pós-Graduado em Ciência Política, Professor Universitário, Deputado Constituinte em 1988, exerceu mandatos federais até 2011. Consultor de Empresas e Instituições, escreve para os jornais O Estado de S. Paulo, Estado de Minas e Correio Braziliense.

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