Fora das Américas
ESTADO DE MINAS, 27 de março de 1997. Opinião
“… A MENOS QUE O OBJETIVO da ALCA seja deixar Cuba fora das Américas…”
Paulo Delgado*
O Fórum das Américas, que acontece em maio próximo, em Belo Horizonte, não contará com a presença de Cuba. O Brasil, país anfitrião do encontro, seguiu os passos do anfitrião anterior – os Estados Unidos – e desenhou o continente dos sonhos dos governantes do Norte: uma América sem Cuba!
Através da Comissão de Relações Exteriores da Câmara Federal pedi esclarecimentos ao Itamaraty e as justificativas alegadas não convencem. Informa o Ministério das Relações Exteriores que o critério de convite para o Fórum segue a relação de países presentes à Reunião de Cúpula das Américas, realizada em Miami, em 1994, quando foi iniciado o processo de conformação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca).
Do ponto de vista diplomático, os critérios e uma reunião realizada em outro país não superam a prerrogativa que tem o país anfitrião de convidar quem quiser.
Qual o sentido – para o Brasil e para a América – do nosso país abrir mão de sua soberania e recusar-se a reconhecer o lugar que Cuba tem na geografia do continente?
O fato de os EUA não convidarem Cuba para uma reunião em seu território não espanta ninguém, o que não quer dizer seja visto com bons olhos por todos.
Mas esta é uma medida da diplomacia norte-americana e não pode servir de parâmetro para toda a América.
Brasil e Cuba são parceiros em diversas áreas, a ilha é um dos países com que temos negócios.
Que vão desde a importação de medicamentos e material hospitalar até exportação de veículos. Como excluir de um evento cujo objetivo é buscar a liberdade do comércio e a integração econômica do continente um país que dele faz parte e com quem o país anfitrião tem relações comerciais?
Cuba vem dando claros sinais de abertura econômica. O investimento no turismo faz de Varadero uma praia como qualquer das nossas. A hotelaria mundial já descobriu o país e hoje pode-se hospedar em hotéis de uma mesma rede tanto no Brasil como em Cuba ou na Espanha. Se este é um processo inicial naquele país, a participação em um movimento de integração de dimensões continentais só pode auxiliar Cuba a avançar na abertura da sua economia.
A “Declaração de Princípios” da Alca, assinada pelos países presentes à reunião de Miami, reconhece que existem no continente americano barreiras ao livre comércio e aos investimentos. A Área de Livre Comércio das Américas teria o papel de eliminar tais barreiras progressivas. Não há explicação dentro da economia, da geografia e da diplomacia para que as limitações comerciais específicas de Cuba não sejam parte destas barreiras. A menos que o objetivo da Alca seja deixar Cuba fora das Américas.
* Deputado federal (PT/MG), membro da Comissão de Relações Exteriores da Câmara Federal.