Enterrem meu coração na curva do rio
O Globo – 3 de Outubro de 2016.
A melhor época para entender a história da sociedade é quando observamos suas ruínas. Vão aí flashes do “velho Oeste” que nos domina. Uma homenagem aos 100 anos de Ulysses Guimarães:
Só deve partilhar da esperança de uma época quem partilha de suas inquietudes.
A facilidade com que se pode distrair e influenciar o público, instruído ou não, é o que sustenta a política.
Ao se considerar líder ou gênio, é sempre bom mapear a planura do território ao seu redor.
Quem gosta de ser felicitado pelo que faz costuma não saber agradecer o que recebe.
Quem acha que as coisas são fáceis não sabe o que está acontecendo. A vida redistribui para outros o bem que os distraídos ou ingratos desprezam por acharem pouco.
Alguém deve proteger o povo dos amigos do povo.
Ninguém conserva para sempre a simpatia do vento.
A convicção não deveria ser uma ferramenta de ataque.
O líder escolhe sozinho seu veneno e o usa em seus iguais.
Como é complicado encontrar palavras boas para ideias ruins.
Em política não há inimigo pequeno, ou amigo grande demais.
A desolação, e a grande capacidade de adaptação do eleitor, o faz combinar, no candidato, modéstia e pompa: a melhor luz para olhar seu interesse.
A maioria do eleitor não se interessa por nenhuma coisa além dele. No dia da eleição, desinteressado, decide quem vencerá.
O desprezo do pai liquida no filho o interesse por saber o motivo dos seus atos.
O político, o promotor, o fiscal da Receita: como gostam de agravar a situação do próximo.
Deve um juiz buscar a pertinência da prova. Não deve, impertinente, pretender julgar a decência da humanidade.
Deve o promotor oferecer a denúncia, não acusar o cidadão como se tirasse, de casa, uma tábua podre do assoalho.
O advogado de defesa não deveria ser pior do que o réu.
A delação premiada pretende um milagre no enterro: ressuscitar o morto e a herança que o matou.
Quando predomina o estado de confusão, as convicções operam em desordem. E são usadas para alistar subordinados no exército de fanáticos da guerra do eu com o outro.
A estupidez é um território importante da sua inteligência.
Embora a imbecilidade seja infinita, ninguém é burro de dar dó.
O político que diz que a realidade é um escândalo quer o escândalo parte da realidade.
De tanto querer se destacar, ele conseguiu rápido se encaixar.
Desvios e erros de políticos costumam ser sempre obra de panelinhas.
Livre é quem se guia pelo maior número de destinos possíveis.
O que seria do pobre se, ao invés do aquecimento global, tivéssemos o esfriamento do Sol.
É muito difícil ver valor na crítica de quem desfruta do objeto criticado.
A crítica é coisa natural. Exige, do criticado, sabedoria para escapar com vida. Criticar não é do mesmo instinto da abelha. Não sendo usada como ferrão, não tem porque o criticado desejar que o crítico morra da sua maldade.
Quando as coisas cronificam, não há mais necessidade de criticar o que acontece. A crítica torna-se parasitária do problema velho, uma anomalia dele.
É hora de dizer coisas que nunca foram ditas.
O futuro é um ponto móvel onde o mundo desenvolvido, infelizmente, não estacionou a nossa espera.
O componente de esperança na atividade política é o único fator progressista que existe nela.