Politicamente incorreto
O TEMPO, Belo Horizonte,10 de maio de 2005.
Fez bem o Presidente Lula ao chamar de bobagem a cartilha e determinar o seu recolhimento.
Foi a histeria puritana nos Estados Unidos, depois da dissolução do mundo binário da guerra fria que, sem ter mais o que fazer de útil, criou o esnobismo da tolerância de linguagem separando a vida real da etiqueta, para glória da censura e dos censores.
Parte da Europa, já há tempos enfastiada de direitos e sem imaginação, embarcou na onda e impuseram juntos à periferia o perverso princípio de fazer da luta pela diferença uma forma de se chegar a igualdade e a inclusão social. Obtendo-se uma discriminação permanente, vai se construindo um direito. Deus sabe como, atentos advogados sabem quanto. Na linguagem a ilusão, como se mudar palavras reduzisse a intolerância em sociedades intolerantes.
Agora toda opinião, palavra, frase, piada ou chiste, confere um direito político e dependendo de condições diversas (sociais, religiosas, raciais, etárias, geográficas, etc.) uma boa indenização.
E o melhor do Brasil, que é o fato da distância social e econômica entre nosso povo não ter se transformado em distância cultural, criando amplas e inéditas possibilidades de inclusão social, é ameaçado por ingênuas cartilhas sobre virtude pública e cidadania.
A pretensão politicamente correta como política de estado, converte-se em um manual de indenizações e distorções. Não se legisla sobre liberdade de expressão e opinião. Nem sobre a bondade humana. Pois o sentido da política é tornar razoável a vida em sociedade, não controlar o todo da vida dos homens e mulheres.
A cartilha é conservadora pois contribui para a dessolidarização e fragmentação entre pessoas e grupos, estimuladas a segregação “positiva”. É reacionária pois enterra a evolução da língua e das palavras no mesmo esquife do neologismo, charadas e da linguística, aposentando a semiologia.
O Brasil é muito recente e criativo para que alguém esteja disposto a lhe travar a língua.