ENTREVISTA EXCLUSIVA – Paulo Delgado: PT precisa rever condutas

Paulo Delgado: PT precisa rever condutas

Panorama

Ao afirmar que cabe ao PT mostrar atos concretos de disposição para sair da crise e retomar seus antigos compromissos com a sociedade brasileira, o deputado Paulo Delgado revela que é preciso rearrumar a vida interna e eliminar vulnerabilidades. Nesse sentido, nas primeiras sessões da câmara, em agosto. Ele pretende dar o primeiro passo, já decidiu que vai apresentar projeto-de-lei estabelecendo que o número de ministérios nunca poderá ser superior a 15. É iniciativa que, no fundo, é uma chamada do governo à responsabilidade, pois o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem 35 ministérios. (Nesse particular o Brasil só perde para Índia, que tem 40). Delgado considera desnecessária e prejudicial essa fartura de pastas, porque confunde a administração e gera gastos. Além disso, ocorre também que muitos cargos disponíveis acabam embalando o apetite dos aliados.

Mas, para ele, esta não é a questão única. Iniciativa também moralizadora seria preservar as empresas estatais da influência política. “Os cargos de direção devem estar destinados aos funcionários de carreira”, ao contrário do que se pratica no Brasil, onde os aliados do governo exigem e obtêm a direção das empresas. E lembra que em quase todo o mundo as alianças são feitas em função de programas, não de ocupação de cargos.

O deputado entende que a política de alianças no governo Lula foi conduzida em equívocos, e esta é uma questão a ser analisada em linha de prioridades para superação de crise atual.

PECADO ORIGINAL

Quando fala sobre as suspeitas de corrupção, que não seriam obra exclusiva do seu partido, Delgado diz que “ o pecado dos outros não é suficiente para absolver o PT”, que tem uma história de 25 anos pregando o fisiologismo e passou todo esse tempo ensinando que o Estado não foi feito para criar poder pessoal.

– É injustificável que tenha enveredado pelo caminho errado, até porque, tornando-se partido majoritário, devia saber que maiores poderes significam maiores deveres.

Um pecado foi abandonar antigos compromissos em nome de alianças que acabaram sacrificando o passado petista. Outro, entre os que o deputado alinha, foi o partido ter se permitido virar espécie de mandarinato do ABC paulista.

– Não somos um partido nacional, mas um clube de São Paulo – critica.

Para Paulo Delgado o fenômeno desorganizador da política, sobretudo nas relações com o congresso, e que abriu as portas para crise que se vive hoje, está na idéia da emenda para reeleição da Mesa das duas casas legislativas, que acabou frustradas, mas deixou marcas. Foi o projeto de poder individual que momilizou o colégio de lideres. Também apareceriam ali os sinais de dissolução do poder das legendas.

Sobre o futuro das legendas que perderam espaço, o deputado petista acredita que na reforma proposta “nada se deve esperar de especular”.Talvez, em nome das prioridades, os esforços das lideranças devessem se concentrar em dois pontos: a Cláusula de Barreira, estabelecendo-se em 5% o mínimo de votos nacionais para que a legenda possa ter acesso ao Congresso, e a fidelidade partidária.

Quanto ao PT, antes de qualquer reforma, Delgado afirma que é preciso também cuidar da política interna.

– Eu não tenho dúvida de que isso é essencial. Temos de eliminar as divisões provocadas pelas tendências, porque quando há disputa as divergências prosperam, o resultado é danoso: o erro de uma corrente é o que ajuda a outra, e o partido, no seu todo, paga conseqüências. Então, precisamos dissolver o que divide.

O deputado qualifica como preocupante o fato de atualmente 20% dos petistas se revelarem descontentes. Além de seu descontentamento pessoal, resultado da decisão do PT nacional de apoiar a candidatura de Alberto Bejani em Juiz de Fora. Por causa dessa atitude, que define como injustificável, ele rompeu com o então presidente José Genoíno e deixou a Secretaria de Relações Internacionais do partido.

2006 DISTANTE

Por essas razões e pela extensão da crise, o representante petista acha que não há como fazer previsões sobre a eleição de 2006, e, quanto ao PT, as dificuldades de prever são ainda maiores, porque vai ser preciso resolver as contradições internas e avaliar as lições, entre as quais a política de alianças. Há erros a serem reparados e percursos a corrigir. Neste ponto, indaga-se do deputado se esses problemas teriam sido lembrados numa carta pessoal que há meses enviou ao presidente Lula, cheia de advertências. Mas ele se limita a dizer que foram tratados “equívocos” petistas em relação à política nacional.

Antes de se pensar em 2006, ainda na sua avaliação, vai ser necessário descobrir e denunciar quem efetivamente deu “o beijo de Judas conservador” no PT, isto é, quem traiu a história do partido. E mais: cabem ao presidente Lula moderação e temperança para conduzir o Brasil até lá.

MENSALÃO

Paulo Delgado foi citado, na semana passada, no noticiário sobre irregularidades no saque de dinheiro que procedia de contas do publicitário Marcos Valério. Ontem, afirmou que considera o episódio esclarecido. O próprio partido reconheceu que o dinheiro retirado por Raimundo Ferreira Júnior era para compromissos administrativos da legenda, não em benefício do deputado. Mesmo assim, como era funcionário, foi demitido.

— Até agora só eu demiti – afirmou. Mas acha que não apenas esse caso, mas todas as suspeitas têm de estar esclarecidas, porque ficou demonstrado que o chamado mensalão virou um “instrumento predador” muito grave. Nada pode ficar obscuro.

Quando se fala em esclarecer, vem à tona a discussão sobre a responsabilidade de Lula. O deputado afirma que essa responsabilidade precisa ser entendida como um dever, não para a preservação do governo, mas dos governados. O que significa também apontar os culpados e não protegê-los. Sobre culpas, fala no plural, lembrando que elas não podem ser debitadas apenas a José Dirceu. Há outros. Muitos Outros.

Paulo Delgado
Paulo Delgado
Sociólogo, Pós-Graduado em Ciência Política, Professor Universitário, Deputado Constituinte em 1988, exerceu mandatos federais até 2011. Consultor de Empresas e Instituições, escreve para os jornais O Estado de S. Paulo, Estado de Minas e Correio Braziliense.

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